domingo, 14 de dezembro de 2008

As altas árvores da minha infância

A luz intensa. O sol a cegar. O menino em cima da árvore. O pai a chamar. A loucura na ponta dos dedos. Uma dor velha. A estupidez das pessoas. A música alta. É preciso comprar cerveja. Esqueço o nome das altas árvores da minha infância. As gipsófilas da minha mãe. Pés descalços na terra fofa. Avaria nos sentidos. Uma varanda com sol. Doença do coração. O pai a chamar. A geleira vazia. O elevador que não chega. Um sorriso entre parêntesis. Não consigo parar. Corro. Policia. Ladrão. Sem perdão. Como um mapa de um tesouro escondido que já não existe. Decoras-me. Viro-me ao contrário. Revolta-me. Os tristes olhos no rosto alegre da minha mãe. Deixo sair. Os corpos estranhos a entrar. O pai doente. O cheiro do detergente da roupa na tua pele. O orgasmo e o riso de Deus. A saliva a pingar da tua boca. Cada dia é uma vida. Gasto vidas todos os dias. A cerveja morta no copo vazio. O pai a chamar. A loucura administrada. O medo suspenso. O gosto do amor que não se faz. A ferrugem das âncoras. A porta fechada. O ódio entre irmãos de sangue. O sangue no lençol. Não consigo parar. O pai a chamar. O murro vazio que me faz vomitar o ar que respiro. Faço a barba. Não faço o coração. O céu indiferente por cima das árvores da minha infância. O pai a chamar. O menino a sorrir.

2 comentários:

Mag disse...

E um bocado de ti. Guardado no tempo. Ao menos isso.

XR disse...

Memórias entre parêntesis. Momentos suspensos no tempo. Crescemos e esquecemos pequenas coisas como o nome das árvores. Ficam as sensações.