segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

- Quando lhe perguntaram o que mais queria no mundo, podes imaginar o que se espera ouvir, coisas bonitas e profundas, aquilo que se pede a um cego, por exemplo se voltasse a ver, as pessoas querem que ele diga que gostava de ver o mar, e gostava de ver as árvores e poder passear nos campos, mas o que o António diz, se pudesse voltar a ver, era mulheres bonitas na rua, era o que ele queria ver, e as pessoas julgam que está a brincar, e riem-se ou, noutros casos, ofendem-se.
- Não sei porquê.
- Acho que ele gostaria de te ver Madalena

Rui Cardoso Martins, in: Deixem passar o homem invísivel

domingo, 9 de setembro de 2012

A Rotina somos nós


A rotina é a coisa menos excitante do mundo; mas a rotina também pode ser a coisa mais excitante do mundo.
   Pára. Pára imediatamente. Pára imediatamente antes que te acerte um bufardo nos cornos. Pára imediatamente de te choramingares por causa da tua rotina. Pára imediatamente de te queixares de que a tua vida é sempre a mesma coisa: casa-trabalho, trabalho-casa. Pára imediatamente de te queixares de que tudo se repete na tua vida
 – e mais o diabo que te carregue e o raio que te parta. Pára. Já. Pára. A rotina és tu. A rotina é o que tu fazes com as obrigações que te fazem ter. E se o teu problema é fazeres exactamente as mesmas coisas todos os dias, porque raios é que não deixas de fazer exactamente as mesmas coisas todos os dias? Não podes? Não podes mas é o catano. Claro que podes. Se acordas normalmente às 8h, começa a acordar às 7h30. E tudo muda. Tens meia hora para nasceres de novo, para te inventares de novo. Meia hora pode ser o suficiente para mudar o mundo. Em meia hora escreves capítulos de um livro, em meia hora gemes de prazer dezenas de vezes, em meia hora cantas dez músicas, em meia hora danças até à exaustão, em meia hora abraças mil abraços em quem amas, em meia hora sorris um milhar de sorrisos. Em meia hora. Basta meia hora para mudar a tua vida. Basta meia hora para te mudares enquanto vida. E não precisaste de mudar de emprego, de mudar de mulher ou de marido, de mudar de casa ou de penteado. Apenas precisaste de ganhar meia hora. Lê de novo, diz de novo: ganhar meia hora. Ganhar meia hora. Ganhar meia hora faz-te ganhar, muitas vezes, um dia inteiro. Ganhar meia hora faz-te evitar perder, muitas vezes, uma vida inteira. Por isso pára. Já não suporto essa porcaria desse choro, essas bostas dessas queixas. A tua rotina é feita por ti. Mesmo que tenhas de entrar todos os dias à mesma hora no trabalho, mesmo que tenhas de sair todos os dias à mesma hora do trabalho, mesmo que tenhas de fazer todos os dias as mesmas coisas no mesmo trabalho com as mesmas pessoas, mesmo que nada mude: tudo pode mudar. Basta ganhares meia hora. Ou até menos do que isso. Ou até mais do que isso. Basta decidires que a tua rotina, ainda que seja rotina, pode ser a coisa mais excitante do mundo – mesmo que não deixe de ser a coisa menos excitante do mundo. Nada é mais imprevisível do que romper, por vontade própria, a previsibilidade. Excitante, não? 
 
Pedro Chagas Freitas e não por Chalana
 

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Nós somos essencialmente o que ninguém vê

Ela vê uma serenidade rara e isso é mais importante do que o Porsche que ele não tem, ela vê que ele se emociona com pequenos gestos e se revolta com injustiças, ela vê uma pinta no ombro esquerdo que estranhamente ninguém reparou, ela vê que ele não faz tudo para que ela fique contente mas faz quase tudo porque ele não é perfeito, ela vê que ele sente uma dor e mesmo assim o teimoso não procura um médico, ela vê que ele erra, mas quando acerta, acerta em cheio, que ele parece um senhor numa mesa de restaurante mas é desajeitado quando se veste, ela vê que ele não se importa para comportamentos padrões, ela vê que ele é um sonhador incorrigível, ela o vê a chorar, ela o vê nu, ela o vê no que ele tem de invisível para todos os outros.

O tamanho importa e Ela é gigante

O Tamanho das Pessoas...

Os Tamanhos variam conforme o grau de envolvimento...

Uma pessoa é enorme para ti, quando fala do que leu e viveu, quando te trata com carinho e respeito, quando te olha nos olhos e sorri .

É pequena para ti quando só pensa em si mesma, quando se comporta de uma maneira pouco gentil, quando fracassa justamente no momento em que teria que demonstrar o que há de mais importante entre duas pessoas: a amizade, o carinho, o respeito, o zelo e até mesmo o amor

Uma pessoa é gigante para ti quando se interessa pela tua vida, quando procura alternativas para o seu crescimento, quando sonha junto contigo. E pequena quando se desvia do assunto.

Uma pessoa é grande quando perdoa, quando compreende, quando se coloca no lugar do outro, quando age não de acordo com o que esperam dela, mas de acordo com o que espera de si mesma.

Uma pessoa é pequena quando se deixa reger por comportamentos da moda.

Uma mesma pessoa pode aparentar grandeza ou miudeza dentro de um relacionamento, pode crescer ou decrescer num espaço de poucas semanas.

Uma decepção pode diminuir o tamanho de um amor que parecia ser grande.
Uma ausência pode aumentar o tamanho de um amor que parecia ser ínfimo.

É difícil conviver com esta elasticidade: as pessoas se agigantam e se encolhem aos nossos olhos. O nosso julgamento é feito não através de centímetros e metros, mas de acções e reacções, de expectativas e frustrações.

Uma pessoa é única ao estender a mão, e ao recolhê-la inesperadamente torna-se mais uma.
O egoísmo unifica os insignificantes.
Não é a altura, nem o peso, nem os músculos que tornam uma pessoa grande... é a sua sensibilidade, sem tamanho...
Willian Shakespeare

domingo, 5 de agosto de 2012

Se amas alguma coisa, liberta-a

Há um ditado taoista que diz:" Liberto do desejo, deslumbras-te perante o mistério. Apanhado pelo desejo, só vês as manifestações." Isto tem a ver com não julgar as coisas pela maneira como esperamos que aconteçam. Quando sabemos aquilo que queremos e fizemos tudo para o obter, o melhor que temos a fazer é darmos um passo atrás e permitir que os acontecimentos se desenrolem. Se o fizermos, conseguiremos mais do que algum dia poderiamos ter imaginado. Mas se pelo contrário tentarmos forçar o nosso desejo, a única coisa que seremos capazes de ver é se estamos a conseguir realizá-lo ou não. É como tentar forçar um ovo a eclodir, ou uma flor a desabrochar. Em vez disso, devemos aceitar as coisas como são e deixar a vida e o amor acontecer à sua maneira, criativa e surpreendente. O amor é infinitamente mais surpreendente do que seriamos capazes de imaginar. Mas apenas quando lhe damos o espaço e a oportunidade de que necessita para acontecer. O amor flui, não acontece por encomenda. O mais que podemos fazer é tentar estar prontos para ele, deixar a vida acontecer, e maravilharmo-nos com o mistério.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O que as mulheres querem

As mulheres não querem ser definidas, antes compreendidas. As mulheres querem uma piada qua as faça rir bonitas, não uma piada que as faça rir por rir. As mulheres não querem que os homens perguntem permanentemente o que é que querem. As mulheres escolhem inúmeras vezes a roupa não porque são instáveis ou porque tem dificuldades de decisão, mas para verem sequencialmente o seu corpo - as roupas são o espelho. As mulheres desejam que os homens adivinhem os seus desejos, que lhes digam palavras rudes com ternura, que lhes digam palavras ternurentas com violência, que a paixão seja inventada (porque quando uma mulher tem prazer sai do seu corpo). As mulheres querem que os homens fechem a porta à noite para elas a abrirem de manhã. Querem ter um filho para não se matarem de amor por uma única pessoa. As mulheres querem ter a esperança de não serem elas, pelo menos uma vez por mês. Elas querem falar com as amigas (ou amigos) o que o seu homem não sabe ouvir. Querem que o seu homem entenda que ele nem sempre é o seu assunto preferido. Querem dançar para os outros homens para chamar o seu para perto de si. As mulheres querem ser ressarcidas dos seus erros, querem que acreditem nelas quando mentem, que duvidem delas quando dizem a verdade. As mulheres querem ser perfeitas dentro das suas imperfeições. Querem ser olhadas nos olhos, na menina dos olhos. Querem viver o que não entendem. Querem dizer o que sofrem para não sofrerem do mesmo. Querem ter sonhos eróticos para substituir as lembranças passadas. As mulheres, ao andarem, querem sentir olhos nas costas, não assobios ou piropos. As mulheres querem descansar num colo. Querem que um homem as ajude a enterrar o passado e, ao mesmo tempo, a desenterrar o futuro. Querem ser surpreendidas com um beijo nos ombros. Querem descobrir, nem tarde nem cedo demais, o que a vida quer delas. Querem que os homens fechem as antigas relações e a pasta de dentes. As mulheres não querem que os homens falem por elas, tal como eu aqui tentei fazer.

Ele

Encontrar

Foi impossível encontrarmo-nos. Há tanta gente. O mundo é tão grande. Os nossos caminhos são tão difíceis. Tudo está contra nós. Foi difícil encontrarmo-nos. Mas encontrámo-nos. Contra as vezes em que estivemos longe de nos conhecermos. E contra as vezes em que nos cruzámos sem nos vermos. O que interessa isso agora? Contra todos os contras, encontrámo-nos.
     É por ser tão contrário a todas as possibilidades, que é difícil acreditar num encontro como o nosso. Não contam os encontros em que as pessoas se apresentam umas ás outras. Nem os combinados. Nem os previsíveis. Isso é que era bom. Só contam aqueles em que duas pessoas se encontram, sem nada terem feito para se encontrarem. Contra tudo o que seria de esperar. Isso sim. Porque nunca acontece.
     Foi o que nos aconteceu. O meu casaco ficou preso à tua camisola. A culpa não foi nossa. Foi da electricidade estática. No meio de uma multidão. Eu não sabia de nada. Quem tu eras. O que era aquilo. E tu também não. O meu casaco não conhecia a tua camisola de lado nenhum. Estavamos presos um ao outro. A morrer de vergonha. Não consegui soltar o casaco. Nem tu a camisola. Ólhamos um para o outro. Cada um a puxar para seu lado. Só havia uma solução: a siamesa. Rimo-nos.
     Foi a primeira vez que nos rimos. Era a primeira vez que nos tinhamos visto. Estávamos tão atrapalhados que nem sequer demos conta que aqueles momentos foram, para todos os efeitos, o nosso primeiro encontro. No sentido mais puro da palavra (Um dia, quando alguém nos perguntar como é que nos conhecemos, temos de arranjar uma grande mentira).
     Lá conseguimos separa-nos, graças a Deus. A tua camisola virou costas ao meu casaco e cada um foi à sua vida. A multidão é enorme. Não se vê ninguém. O tempo passa, afastando as pessoas ainda mais. E como estou de relações cortadas com o meu casaco, nem com os meus botões posso falar.
     Mas depois encontramo-nos outra vez. outra vez, como se pela primeira vez. tu vens dum lado e eu doutro, tu da tua vida e eu da minha. É tarde de mais para nos escondermos. É impossível fugir. lemos os pensamentos um do outro e os nossos olhos riem-se. Pensamos no casaco e na camisola que se agarraram como se fossem velhos amigos, com toda a cumplicidade da lã virgem.
     Afasto-me para te deixar passar, recolhendo o casaco, implorando-lhe entre dentes que não se atire outra vez à tua camisola. levantas a mão, como se me fosses bater (pensas sem dúvida que culpo a tua camisola por tudo o que aconteceu). Mas não falamos. Seguimos mais uma vez, cada um pelo seu caminho. Os nossos dois desencontros transformaram-se, de repente, em encontros de verdade. Apetece-me ir atrás de ti. Tenho a sensação absurda que somos amigos há muito tempo e que passaste por mim sem me falar. E dou comigo, sem dar por isso a procurar-te entre as pessoas, sem saber bem porquê. Até sentir no coração uma pequena esperança, que nasce dentro de mim sem que eu seja tido ou achado: a esperança, muito pequenina, de encontrar-te mais uma vez. Um dia. Noutro sítio. Sabia, nesse momento, que, se te visse, havia de me lembrar.
     E depois - pela minha saúde - encontrámo-nos pela terceira vez. Contra tudo. É demais. Redemo-nos. Rimo-nos e parámos, um diante do outro, obrigados a reconhecer a derrota. Não fugimos. Seria desrespeitoso para com as forças do destino. falamos. falamos das coincidências que nos perseguiram desde o momento em que nos vimos. O melhor é deixarmos de resistir. falamos.
     Derrepente, achamos que fomos cosmicamente escolhidos para nos conhecermos. Fico com a tua morada. Somos quase vizinhos. Despedimo-nos depressa, mais depressa do que nos encontrámos. Já não somos desconhecidos. Para nos podermos encontrar, nunca mais estamos sujeitos à força das estrelas do céu, nem à electricidade estática.
     Mas quantas pessoas se encontram só por encontrar? Na multidão do mundo, onde cada um se guarda nas pessoas que ama, vivendo entre a pequena multidão de quem conhece, é quase impossível duas pessoas encontrarem-se de verdade. São encontros que acontecem contra todos os outros encontros. A começar pelas próprias pessoas que se encontram, que não querem sequer encontrar-se. Encontram-se em estado de choque.
     Encontrar é, ao mesmo tempo, juntar e opor, abraçar e empurrar. As contrariedades são essenciais - à curiosidade, à atracção ao desejo. É através delas, as diferenças, que se estabelece a distância entre um e outro, sem a qual não pode haver amor. Quem ama alguém ama por quem é. Eu amo alguém que me está sempre a lembrar quem ela é - e não a mim.
    O amor não é um fim nem um meio - é uma condição. É por isso que o verbo amar é o que mais se parece com encontrar.

ENCONTRAR: verbo transitivo (de em + contra). Do latim contra; em oposição, em inimizade com;em luta com (...) mas também exprime contiguidade, proximidade; junto de; em contacto com (...) Sentido: ir de encontro a; esbarrar, topar; chocar; dar de cara com; deparar casualmente.

Miguel Esteves Cardoso
    

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Beba um copo pela sua saúde

Cada vez que ouço falar do problema do álcool, apetece-me logo beber um copo de vinho. Acho até uma grande leviandade falar no álcool como um problema - muito mais grave que o problema do álcool, por exemplo, é o problema da seca.

Na verdade, o problema do álcool não é problema mas solução dos problemas do mundo. Se não fosse proibido beber álcool nos paises muçulmanos, acabavam-se logo os homens-bomba - nenhum iria sóbrio e em vez das bananas de dinamite levariam bananas da venezuela ou da Madeira presas à cintura. O vinho tem mais efeitos pacíficos que os chás nas cimeiras de paz entre árabes e israelitas.

Acabava logo a guerra no Afganistão se em vez de papoilas investissem na plantação de vinha - lá está o problema dos muçulmanos não poderem ingerir álcool. Seriam menos sisudos e já saberiam apreciar como deve de ser, uma boa obra de arte tal como um Gustave Courbert e a sua "origem do mundo" ou a colecção Berardo no CCB.

E já repararam que as drogas duras são originárias de paises onde não há vinho decente? Já mais se inventaria o ópio em Borba ou a heroina no Alto Douro.
E em vez de ópio e drogas duras, estes paises poderiam dedicar-se à exportação de vinho, sabe-se lá com que qualidades exóticas, enriquecendo ainda mais as cartas de vinho dos restaurantes mais luxuosos do mundo.
As drogas pura e simplesmente acabariam, tal qual como a pequena criminalidade e a sobrelotação das cadeias aliviando a despesa do Estado.

E já não há pachorra para aquelas almas que demonizam o álcool. Tudo faz mal quando se exagera, é logico. Pode-se morrer com ovos cozidos, antibióticos, água, papel de máquina, pistácios (se pesquisarem no google vão encontrar de certeza casos de pessoas que morreram de excesso de pistácios). Além de que o vinho e a cerveja tem propriedades benéficas cientificamente provadas. O que é preciso é haver campanhas não para deixar o álcool mas como saber geri-lo. O problema do álcoolismo é o mesmo das finanças: falta de gestão. O dever do Estado não é proibir, mas informar e instruir. Nos paises onde o álcool é proibido, as pessoas bebem menos mas embebedam-se mais. E, no entanto, não são felizes. Andam aos tropeções e caem na rua. Bebem depressa e sem prazer. Desatam à pancada. Enfim, a bebedeira só devia entristecer porque se assinála o fim de uma sequência de copos, e não de um naipe de cartas.

O vinho continua a ser a resposta e uma das grandes invenções da humanidade. Beba um copo, pela sua saúde (mas com moderação)

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Há vidas assim, que nos esmurram a consciência e o pensar corta-nos a respiração

"Morreu ontem o meu particular amigo, o mendigo Justino.
Era um homem considerável, sutil e sórdido, com uma barba tão rija como a sua organização cerebral que se estabelecia neste princípio perfeito: a sociedade tem de me dar tudo quanto goza, sem abundância mas também sem o meu trabalho - princípio mais práctico que socialista.
A primeira vez que vi o Justino foi à entrada da velha livraria, ao fundo da rua direita. Tinha um casaco escuro agastado pelo tempo, botas pesadas pela lama e uma barba de profeta cheia de lêndeas pela maneira como era coçada. Era um sábado pela manhã.
- Hoje não há nada.
- Devo notar que há já dois sábados que não me dás nada.
- Não seja importuno, já disse.
- Bem, não te zangues. Notei apenas porque a recusa não foi para sempre. Este cidadão (apontando para mim) vai ceder-me 500 escudos.
- Eu!?
- Está claro. Fica com esta despesinha a mais: 500 escudos aos sábados. É melhor dar a um pobre do que gastar mal o dinheiro em coisas fúteis. Peço, porém, para notares que não sou um chulo, sou um mendigo, esmolo, esmolo há 20 anos. Tens diante de ti um mendigo autêntico.
- E porque não trabalha?
- Porque é inútil.
- Dei-lhe sorrindo uma nota. Justino não agradeceu e quando o vimos pelas costas, o livreiro indignado alvitrou contra o mendigo que com tamanho descaramento arrancava dinheiro à algibeira alheia. Achei original Justino. Como mendigo era uma curiosa figura perdida em plena cidade.
Mas o mendigo desaparecera, e só um mês depois, ao sair de casa, encontrei-o à porta.
- Deves-me 2 contos de quatro sábados, e venho ver se me arranjas umas botas usadas. Estas estão em petição de miséria.
Fi-lo entrar, forneci-lhe botas e algum dinheiro.
- E se me desses o almoço?
Servi-lhe à mesa, num prato, carne com arroz.
- A mesa e o talher são inutiladades. Não peço senão o que necessito no momento. Pode-se comer perfeitamente sem a mesa e o talher.
Sentou-se no chão e comeu directamente com as mãos. Depois pediu água, limpou as mãos ás calças e saiu.
- Espera ai homem, nem dizes obrigado??
- É inútil dizer obrigado. Só deste o que falta não te faria. E deste por vontade. Talvez fosse até por interesse. Deste-me as botas velhas como quem compra um livro novo. Conheço-te.
- Conheces-me?
- Não te enchas vaidoso. Eu conheço toda a gente. Até para o mês.
Confesso que que o mendigo não me deixou uma impressão agradável. Mas era surpreendente, inédito, com a sua grosseria e as suas atitudes de Sócrates de ensinamentos. E diariamente lembrava a sua figura, a sua barba cheia de lêndias. Uma vez vi-o sair da assembleia geral da câmara municipal e na mesma noite na primeira fila do teatro.
Certa vez, era já madrugada, atravessava o jardim do coreto, vi uma altercação num banco. Era o Justino a ser agarrado por dois policias.
- Anda seu vagabundo.
- É inútil, não vou.
- Então vais à força.
- É inútil. Sabem o que é este banco para mim? A minha cama há doze anos! Por direito de hábito, respeitam-na todos. Tenho visto passar muito guarda, muito comissário, muito juiz. Eles vão-se eu fico. Nem tu, nem o juiz nem o delegado serão capazes de me tirar esse direito. Moro neste banco há uma dúzia de anos. Boa noite.
Os policias puxaram dos cacetetes. Intervi.
- Deixa. Eles levam-me, eu volto.
Os policias sovaram-no sem dó nem piedade, mas deixaram-no ficar no banco. Só posso imaginar o pior se não estivesse presente.
- Foi inútil, eu disse. Mas eu sou teu amigo.
- Meu amigo?
- Certo. Nunca te pedi nada que te pudesse fazer falta e nunca te menti. Fica certo. Sou o teu melhor amigo.
- E não gostas de ninguém?
- Não é preciso gostar de ninguém para ser amigo. Amigo é o que não sacrifica.
E desde então comecei a sacrificar-me voluntariamente por ele. A correr à policia quando o sabia preso. A procura-lo quando não aparecia há mais de um mês. E desesperado porque não aceitava mais de 100 escudos da minha bolsa. E respondia sempre, inexorável, a cada prova da minha simpatia:
- É inútil, inteiramente inútil.
Durante três anos dei-me com ele sem saber quantos anos tinha ou onde nascera. Nem isso. Apenas consegui saber que fumava aos domingos e ás terças. Embebedava-se ás quintas e ia ao teatro ás sextas e ás segundas. E não faltava ás reuniões gerais da câmara municipal. Nunca tomava banho, pedia pouco e ao menor alarde de genoresidade, limitava o alarde com o seu desolador: é inútil.
Teria tido vida melhor? Fora rico? Sábio? Amara? Odiara? Sofrera? Ninguém sabia. Um dia disse-lhe:
- A tua vida é exemplar.
Ele respondeu:
- É um erro servir de exemplo. Vivo assim porque entendo viver assim. Condensei apenas os baixos instintos da cobiça, exploração, depravação, egoísmo em que se debatem os homens se na consciência de uma vontade que se restringe e por isso é forte. Numa sociedade em que os parasitas tripudiam - é inútil trabalhar. O trabalho é de resto inútil. Resolvi conduzir-me em idéias, sem interesse, no meio do desencadear de interesses confessados e inconfessáveis. Sou uma espécie de imposto como qualquer- porque não quero mais que isso.
- E não amas?
- nem a mim mesmo porque é inútil. desses interesses encadeados resolvi tirar a percentagem mínima,e dai o ter vivido sem esforço com todos os prazeres da sociedade, sem invejas e sem excessos, despercebido como o invísivel. Que fazes tu? Escreves? tempo perdido meu amigo, com pretensões a tempo ganho. Que gozas tu? Teatros, jantares, festas em excesso nos melhores lugares. Eu gozo também quando tenho vontade, no dia de percentagem no lugar que quero - o menor, o insignificante - os teatros e tudo quanto a cidade pode dar de interessante aos olhos. Apenas sem ser apontado e sem ter ódios.
- Que inteligência a tua!
- A verdadeira inteligência é a que se limita para evitar dissabores. Tu podes ter contrariedades. Eu nunca as tive. Nem as terei. Com o meu sistema, dispenso-me de sentir e de fingir, não preciso de ti nem de ninguém, retirando dos defeitos e das organizações más dos homens o subsídio da minha calma vida.
- É prodigioso.
- É um sistema que serias incapaz de praticar porque tu és como todos os outros, ambicioso e sensual.

Quando soube da sua morte corri à morgue a fazer-lhe um enterro digno. Não era possível. Justino tinha deixado um bilhete no bolso pedindo que o enterrassem na vala comum - a entrada geral do espectáculo dos vermes.
Sai desolado porque esta criatura fora a única que não me dera nem me tirara, e não chorara, e não sofrera e não gritara, amigo ideal de uma cidade inteira fazendo o que queria sem ir contra pessoa alguma, livre de nós, como nós livres dele, longe de nós como ali ao nosso lado.
Sai também com frustação, porque o meu interesse no Justino fora apenas o desejo teimoso de descobrir um segredo que talvez não tivesse.
Enfim, morreu. Ninguém sabia da sua vida, ninguém falou da sua morte. Um bem? Um mal?
Nem uma coisa nem outra, porque, afinal, na vida tudo é inteiramente inútil."

João do Rio

terça-feira, 17 de maio de 2011

sou

O mundo assim como sou não me basta
tocam-me no braço pingos de chuva timidos
a chuva plena de momentos intocáveis
os olhos tristes depois do que sinto
tédio nas noites em que não me reconheço

quem és tu, que te deitas na minha cama e comes na minha mesa?

sou a intóxicação de sentimentos
um diagnóstico mal conseguido
violentações íntimas que as lágrimas acusam
o eco dos passos que não dei
sou mais o que sinto e pouco o que digo
sou a saliva no teu peito
sou o fim da página e uma nova
não a letra cuidada
mas a parte riscada
sou a luz da sombra
a concavidade da axila e da palma do pé
sou o suor salgado
escorrido no fruto proibido
sou raiz
duna em praia deserta
somente pessoa por acontecer
raio rutilante na demora de um beijo
mais o que sinto
do que o que o corpo mostra
sou o meu chão
a chuva no rosto
o raio de sol na curva do copo de cerveja
sou o dia por viver
o primeiro amor aos beijos roubados
ao segundo e ao terceiro
sou a inteligência ingénua
que não sabe abrandar antes da curva
o silêncio à espera de ser quebrado
sou o cinzento do céu às terças
e o céu cheio de azul ao sábado
sou a torre das águias
o bacalhau no forno ás quatro da tarde num restaurante de estrada em Pavia
sou a nudez de uma música
sou o que não viste
quando olhavas e me pensavas ver
sou a lâmina nas palavras
v erso e invers o
a música do Chico em construção
sou o todo na lacuna das partes
as pegadas numa rua diferente
o sabor de uma laranja num duche de inverno
sou o peixe no anzol da tua cama
e o sal no mar
uma bússula tonta
que te faz perder em mim
sou a saliva escorrida
do prazer de uma dentada de maçã
sou a ilusão
da parte issencial de um todo
sou um sofá confortável
e uma cadeira incómoda
sou um olhar cómodo
e incómodo no olhar
sou o pessimismo da razão
e o optimismo da vontade
o estrangeiro do Camus
a contrariedade a todas as possibilidades
sou confidências
de meninas mulheres com segredos na cama
um corpo que quer ser lido
a aguarela por terminar
sou a resposta a uma pergunta sem nexo
com sexo pela manhã
a chuva de ontem
o sol de domingo
os restos da madrugada
e o fim do dia
sou o fechar num abraço
os beijos que dei e os que quero dar

sou a parte escondida
sou

um algoritmo de adição
e a soma de tudo isso

plz?

If someon tell me "plz" because it's shorter than "please" then i reply "no" because it's shorter than "yes"

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Meti-me nos copos. Pela minha escrita

"Meta-se nos copos. Pela sua escrita", foi o que fiz no curso de escrita criativa - orientado por Pedro Chagas Freitas. O ínicio foi mesmo estilhaçante: um copo a voar em direcção ao chão, desaparecendo em mil cacos no chão. Felizmente estava vazio. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Gostei imenso da experiência, mas não me vejo a escrever romances. Aprendi um pouco mais sobre estruturação textual; dimensão léxical; a não ignorar o ; nem o - muito menos os : e o mais importante além do divertimento: a sair do quadrado e libertar a imaginação. A seguir fica um pequeno exemplo de uma das aulas, em que nos foi proposto alterar as expressões a colorido, dando uma outra riqueza ao texto. O resultado foi espantoso e muito divertido:-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Texto original:
"Comprou um carro azul - e foi experimentá-lo imediatamente. O barulho do motor a trabalhar era grande (ao andar sobre o asfalto quente). Gostou: da sensação, da intensidade - motor. Acelerou: ainda mais. Prego a fundo."-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------A minha versão:
"Comprou um carro azul - e foi calçá-lo de gás. O barulho do motor a trabalhar era grande (ao andar sobre o negro fervilhante). Gostou: da sensação, da intensidade - motor. Acelerou: até despir o azul. Descarnou o chassi."-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Outra versão entre muitas outras:
"Comprou um carro azul - e pegou-lhe rutilante. O barulho do motor a trabalhar era grande (ao andar sobre a esteira de Hades). Gostou: da sensação, da intensidade - motor. Acelerou: tsunami sideral. Cristo pregado ao chão." ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------e com todas as expressões misturadas e muita criatividade, deu para construir um poema no mínimo surreal, mas com muita piada:

Sobre a esteira do diabo
tapete em erupção
cobra preta e viscosa
mergulhou no animal
pegou-lhe rutilante
calçou-o de gás
até despir o azul
cuspir as entranhas
tsunami sideral
cristo pregado ao chão
descarnou o chassi
setasiou rumo ao alvo
cobra sexy
ao fluir em erupção
faiscou-o rutilante
no limiar do décibel da surdez
--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
No final, nenhuma escrita será a mesma (há que acreditar no Pedro).

sexta-feira, 1 de abril de 2011

e é para isto que sobem os impostos e cortam nos beneficios.E não!Isto não é mentira

É por estas e por outras que estamos à rasca: . -------------------------------------------------------------------------------------- ---------------------------------------------------------Há maquinistas na CP que ganham 50 mil euros/ano e ainda vão para greve... . Empresa lisboeta gasta 4,5 milhões em prémios de antiguidade e assiduidade. Mas a CP é a campeã, com 195 subsídios. Os trabalhadores da CP - que hoje estão mais uma vez em greve, nomeadamente, contra os cortes salariais -, têm vencimentos anuais muito acima da média portuguesa. De acordo com a folha salarial da CP a que o SOL teve acesso, um inspector-chefe de tracção recebe 52,3 mil euros, há maquinistas com salários superiores a 40 mil euros e operadores de revisão e venda com remunerações que ultrapassam os 30 mil euros por ano. . ------------------------------------------------------------------------------------------ -------No total, os trabalhadores da CP dispõem de 195 itens que contribuem para engordar a sua remuneração variável no final do ano. O número atípico de apoios, ajudas e subsídios tem contribuído para que a empresa engrosse a factura com remunerações. Em 2009 foi de 104,5 milhões de euros anuais (segundo os últimos dados disponíveis). «O salário dos maquinistas, por exemplo, engloba abonos de produção, subsídios fiscais, ajudas de custo e subsídio de agente único», explica fonte oficial da empresa pública. «Só por se apresentar ao trabalho, cada maquinista recebe mais de seis euros por dia, devido ao subsídio de assiduidade». .------------------------------------------------------------------------------------------ ------------------Os diversos subsídios são resultado das negociações entre as várias administrações que têm passado pela empresa e os sindicatos de trabalhadores ao longo dos anos. Ao todo, representam mais de metade - 54,3% - dos encargos totais com salários. Apenas em subsídios de condução, a CP gasta cerca de quatro milhões de euros, aos quais se juntam 2,4 milhões de euros em prémios de condução e 3,3 milhões de euros em prémios de chefia. «O tempo médio de escala dos maquinistas é de oito horas por dia, num total de 40 horas semanais. Mas, em média, o tempo de condução está entre as três e as quatro horas diárias», sublinha a mesma fonte. .-------------------------------------------------------------------------------------------- -------------------Já as diuturnidades (subsídio por antiguidade) custam 3,3 milhões de euros à empresa e os gastos o pagamento por trabalho em dias de descanso não compensados ascendem aos 4,5 milhões de euros. Os trabalhadores da CP estão em greve às horas extraordinárias até ao final de Abril, devido ao anúncio de 815 despedimentos no grupo e aos cortes salariais exigidos pelo Governo. . -------------------------------------------------------------------------------------------- ------------------------------------------------------------------------------------------A CP prevê «fortes perturbações» na circulação de comboios, durante o dia de hoje. Também no Metropolitano de Lisboa, outra empresa detida pelo Estado, existem vencimentos de luxo. Há uma secretária administrativa que recebeu 64,6 mil euros em 2009, dos quais 5,7 mil dizem respeito a subsídios de carreira administrativa. .---------------------------------------------------------------------------------------------- ------------------------------------------------No total, existem 14 técnicos superiores que ganham mais do que os vogais do conselho de administração. Um destes técnicos auferiu 114 mil euros em 2009, mais 42 mil euros do que o chairman. . --------------------------------------------------------------------------------------------- in: Jornal Sol . --------------------------------------------------------------------------------------------- ---------------------------------------------------------------------------A CP é só uma entre muitas empresas públicas - sem falar nas milhentas associações e fundações públicas, que nem o Estado sabe quantas são e para que é que servem - que nos sugam até ao tutano. é só um pequeno exemplo do que o que nos separa dos paises desenvolvidos com qualidade de vida. --------------------------------------------------------------------------------------------- ---------------------------------------------------------------------------------e como ganham pouco, coitados,vão voltar à greve para a semana...

quarta-feira, 16 de março de 2011

Uns tem radioactividade, outros tem políticos radioactivos

O que aconteceu no Japão podia ser considerado um Cisne Negro (um acontecimento altamente improvável, imprevisível e de enorme impacto) mas não. Já se sabe que as terras do sol nascente são geológicamente instáveis e tremem constantemente. E pelo que se está a assistir, mal preparados em termos de segurança nuclear, para o qual tinham sido alertados pelos técnicos internacionais de segurança nuclear.

Agora vamos relativizar. A nossa crise é preocupante, e os nossos políticos andam a brincar connosco. Comparando com o Japão o nosso drama é rizível, insignificante, mas não tenho dúvidas nenhumas de que, daqui a uns cinco, seis anos, o Japão vai estar a bombar de novo e nós continuamos a chafurdar na crise...


quinta-feira, 3 de março de 2011

Isto podia ser um post, ou uma questão existêncial mas é mesmo uma pergunta parva

Se uma torrada quentinha acabada de fazer nos escapa da mão e cai no chão sempre com o lado da manteiga virado para baixo e um gato cai sempre de quatro, o que aconteceria se barrassemos as patas do gato com manteiga?

quarta-feira, 2 de março de 2011

La Plante Mutante: 10 conselhos para ser Moderno

A melhor pior banda do mundo!
Do mundo não que eles são mutantes. Do Universo!

E são Modernos! Eu também sou moderno e vou vê-los (sim porque ouvi-los pode causar danos irreversíveis) na Associação Recreativa e Cultural de Músicos de Faro. E porque é carnaval, ninguém leva a mal.

E agora, 10 conselhos para ser Moderno!






AVISO: A certa altura poderar ter a percepção de que não está no meio de um concerto...

terça-feira, 1 de março de 2011

Ontem, o sonho de qualquer pai era que os filhos fossem doutores. Hoje querem que eles sejam famosos

Elizaveta é nova, mas já aprendeu as regras do star-system português: é preciso trabalhar sem ganhar, para depois se ser pago por actividades que não são trabalho. Por exemplo as festas. São as chamadas “presenças”, em que a modelo recebe um cachê para simplesmente estar lá. Noutra época, dir-se-ia depreciativamente que estava a “fazer ofício de corpo presente”, por analogia com o defunto na missa por sua alma. Hoje esse papel é quase sinónimo de estar vivo. “Não me importaria nada”, diz Elizaveta “de estar três horas por dia numa festa, para ganhar a vida".

Há decerto empregos piores. Mas há um percurso a trilhar e dificilmente se saltam etapas. É preciso estar numa festa, para se ser fotografado e aparecer numa revista. A seguir é-se contratado por uma agência de modelos e, por fim, chega-se à televisão. A ordem pode variar um pouco, depende da sorte e aptidões de cada um. É possível saltar de um concurso de televisão para uma agência e daí para a passerelle. Mas isso não é para todos. E nem todos o pretendem. O sonho supremo já não é a moda, mas sim a televisão e, nesta, ser actor. Não por amor às artes performativas, mas para estar na televisão, que por sua vez não é um objectivo profissional, mas um veículo. Um veículo para a fama. Esta é verdadeira ambição: ser famoso. E como se consegue? Eis um guia prático:

“Há três situações, três maneiras de se chegar à fama”, explica Duarte Menezes, que é cabeleireiro e conhece a fundo os meandros do mundo das celebridades em Portugal. “A primeira situação é: uma cara bonita, um bocadinho loura, que apareça numa festa com as mamas à mostra. Durante meses só se fala dela”. Não falha. Mas é difícil. Tem de se saber jogar. É preciso ser-se convidado para as festas. Há duas maneiras: ou se cai nas boas graças de um Relações Públicas (RP), ou se é amigo ou amante de alguém que nos leve.
Os RP são peças-chave. São eles que organizam as festas e distribuem os convites. Elaboram as “guests lists”, das quais é fundamental constar. A partir daí, o caminho para a fama está aberto. E quem são esses RP? Poucos. Uma dezena, segundo Duarte Menezes. “Digo-lhe já os nomes deles: é a Maya, a Helga Barroso, a Marta Aragão Pinto, a Marta Wahnon...” Eles é que mandam. Decidem quem vai e quem não vai às festas, que podem ser a inauguração de uma loja, o aniversário de uma discoteca, a ante-estreia de um filme, o lançamento de uma marca num centro comercial. O motivo pouco importa: é uma festa e é preciso estar lá.

“Há os chamados papa-festas”, diz Duarte. “Não falham uma. Estão lá sempre as pessoas do jet-set, modelos. Mas os mais procurados, hoje, são os actores”. Estes, actores, modelos e celebridades, são pagos pela “presença” na festa. Os outros são capazes de matar para estarem presentes. “Uma pessoa que apareça nas festas está lançada. Não é preciso ter talento. As festas são o motor para a fama”. E quem vai filtrando os candidatos são essa figuras poderosas, que de certa forma mandam no país, mesmo sem terem sido eleitas: os RP. “A culpa de haver tanta gente famosa sem nada fazer é dos RP”.

Dizem: ‘Ó Duarte, eu preciso de aparecer. Faça-me acontecer Duarte’. Eu levo-as duas, três vezes, às festas. À quarta já são convidadas. Depois aparecem nas revistas com jóias que eu lhes emprestei, a dizerem que são da avó”.
Por vezes é ele próprio, Duarte, a organizar festas. Outras vezes leva as “meninas” a desfiles de moda. “A primeira fila da Moda Lisboa é o lugar fundamental”. São as caras que são fotografadas, que aparecem nas revistas. Duarte tem um passe que lhe permite assistir a todos os desfiles, e vai sempre acompanhado. “Há três sítios onde não gosto de ir sozinho: à praia, ao cinema e a um desfile de moda”. Quatro mulheres hoje muito famosas em Portugal foram lançadas desta maneira, diz o cabeleireiro. Estiveram com ele na primeira fila da Moda Lisboa.
Segundo Duarte, há uma explicação para que muitas raparigas procurem a ajuda de homens homossexuais: assim não serão acusadas de estarem a trocar favores sexuais por promoção. Mas também há rapazes que usam homossexuais mais velhos para se lançarem no circuito das festas e da fama. São geralmente jovens heterossexuais, que não dissuadem o “amigo” gay de se apaixonar por eles, enquanto vão aceitando jantares, viagens e acesso a eventos e pessoas. Alguns são bissexuais, e não se importam de se insinuar junto dos muitos homossexuais influentes que há no mundo da moda. Duarte chama-lhes pejorativamente os “bichos”, por oposição à geração mais velha, que tudo fazia por amor ou pura e desinteressada luxúria - as “bichas”.

A segunda via para a fama: “Dormir com alguém da bola. Jogador, ex-jogador, etc. Uma rapariga que diga numa revista que já foi para a cama com o Ronaldo tem as portas abertas”. É uma estratégia recente, explica o cabeleireiro. Terá começado no Reino Unido, onde a indústria dos tablóides é poderosa. Depois da morte da princesa Diana, as revistas, privadas do seu tema favorito, voltaram-se para o casal Beckam, dando aos futebolistas um estatuto glamoroso que nunca tinham tido. Cá, a prática começou com Cristiano Ronaldo, mas agora qualquer um serve.
Uma terceira via são as festas de caridade, tradicionalmente frequentadas “pelas verdadeiras senhoras de alta sociedade”. Podem ser em organizações de beneficência ou em embaixadas, ou organismos como o Banco Alimentar contra a Fome. “Põem um avental e ficam ali a ser fotografadas a cozinhar para os pobrezinhos, enquanto as verdadeiras senhoras se escondem das câmaras”.

Mas há mais vias: os programas de televisão, como os Ídolos ou Operação Triunfo, em que é preciso possuir algum talento, e os do tipo do Big Brother, Quinta das Celebridades ou A Casa dos Segredos, para os quais nenhum talento é necessário. Mas também para entrar nestes “shows” é preciso ter amigos influentes.

Foi desde o aparecimento do Big Brother, no ano 2000, na TVI, que as pessoas começaram a pensar que era fácil ser famoso. O marco seguinte foi os Morangos com Açúcar, em 2003. A série da TVI fez nascer uma geração de famosos muito jovens, bonitos e que sabem representar e dançar. Ou parece que sabem. Os “Morangos” já vão na 8ª edição e são uma fábrica imparável de famosos, que têm, nas festas, uma cotação superior à dos modelos – exceptuando, talvez, as raparigas que dormiram com o Ronaldo, sugere Mónica Lopes, 32 anos, que abriu há 7 meses uma agência de modelos, a ML.

“Dantes, em Portugal, o sonho de todos os pais era que os filhos fossem doutores. Hoje querem que eles sejam famosos”. Dalila Martins, 59 anos, foi modelo nos anos 80. Mas só depois de ter concluído a licenciatura em Filologia Românica. Já dava aulas quando começou a fazer desfiles. E já tinha tido o primeiro filho. “As prioridades eram outras naquele tempo”, explica ela. “Houve uma inversão de valores. Hoje as pessoas vêem a fama como um objectivo em si mesmo. Porque lhes é dada a ilusão de que o podem alcançar sem grande trabalho.”

No tempo de Dalila também havia um sistema para se chegar ao estrelato como modelo. “Era preciso conhecer as pessoas certas e ir aos lugares certos”. Ela frequentava o Frágil e era amiga do seu proprietário, Manuel Reis, e do cabeleireiro José Carlos. “Era preciso entrar num certo mundo, muito elitista. Hoje a moda e o mundo dos famosos democratizaram-se.”
Dalila continua a ir a festas, bares e restaurantes “da moda”, mas não vê lá a “gente da moda”. Mudaram de sítios? Passam despercebidos? Como já não constituem uma elite, talvez sejam toda a gente e andem por todo o lado. “Onde é que eles estão? Não os vejo nas festas, nem no Lux os encontro. Acho que já não existem”.

Mais um excelente trabalho de Paulo Moura in
(PÚBLICO)

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Ela percebeu tudo



Ela percebeu tudo,mas nada podia fazer. É a beleza das coisas perfeitas. E a música? footsteps on the dance floor. Atravessa o corpo e pinta-me por dentro. E quero rir só porque sim. E rir só porque não. E ela que percebeu tudo. E saio só para ficar relaxado, ou para ir a lado nenhum. E há aviões que sobrevoam viadutos. Ecos nas esquinas vazias. Rumores das vozes saidas das casas com portas pequenas. E a música? And the music don´t feel like it did. And the music don´t feel like it did. E rir. E um reflexo só meu. Só meu. E engloba tudo desde sessões de sexo torrido a domingos de cinema em casa com deprimentes meias de lã. Acordar e adorar segundas feiras. Crescer no inverno e descansar no verão, porque crescer cansa. E a música? I'll be true. tear drops in my eyes, next time i'll be true. Há velhos sentados nos bancos do jardim. Adolescentes que se beijam na boca depois do liceu. Tenho rótulos nas prateleiras da dispensas e na cabeça. Produtos prontos a consumir. Que as nossas cabeças comtinuem redondas apenas para os nossos pensamentos poderem mudar de direcção. Direcção. E a música? Perfeita. É a beleza das coisas perfeitas. And the music? Dont´t feel like it did. And the music? Don't feel like it did

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O estado a que o Estado chegou

Alguma coisa vai mal quando:

um (muitos!)funcionário/director público aufere cerca de 4.500 euros de ordenado e 11.500 euros de subsídios! e o espaço infantil de uma biblioteca municipal fecha de tarde, porque não há dinheiro para contratar um funcionário.

um (imensos!)funcionários/administradores públicos ganham prémios de gestão em empresas com prejuizos constantes! e núcleos museológicos com um imenso e valioso património histórico, como instituições culturais importantes, mantêm-se fechados por falta de verbas.

um assistente/secretário de um ministério público ganha mais do que o ministro/a e há alunos a levar cobertores para a escola porque têm frio nas aulas.

um Estado manda cortar nos salários públicos, nas pensões, nos abonos de familia, etc. e três ministérios aumentam a despesa salarial.

um Estado impõe medidas draconianas para reduzir a despesa e a despesa... aumenta!


O Estado vai mal neste estado...


Sempre evitei escrever aqui sobre politica, mas neste estado a que chegou o Estado... quase que imploro que venha o FMI, porque só tem medo do FMI, quem anda a enriquecer à nossa conta.

Os nossos governantes apelam à contenção mas eles próprios não se contêm em gastar o que não é deles e em muitos casos, em benefício próprio. Assim estão a levar o país à banca rota. Depois vão-se embora e quem fica com a conta e com juros elevados para pagar, somos nós e os que hão-de vir...

Enquanto não houver uma Lei que criminalize quem prejudicou gravemente o estado por gestão danosa e a Lei não for respeitada, este país não sai do lodaçal.

E lamento profundamento que os votos em branco não sejam representados na assembleia da república por cadeiras vazias. Mas não deixarei de o fazer, de votar em branco enquanto só houver partidos e politicos que se servem a eles próprios, em vez de servirem o país e o povo.

Mas o estado a que chegou o Estado e os políticos que temos, também é responsabilidade nossa, ou a abstenção não tivesse a maioria absoluta que tem.

Anjos de Port Au Prince

O terramoto que abalou a igreja de deus (Christchurch), na Nova Zelândia, trouxe-me à memória estes anjos (fantasmas) de uma terra (fantasma) esquecida.


Num promontório de Port-au-Prince, as crianças deficientes do orfanato Village Espoir olhavam serenamente a cidade em ruínas.
Cordilheiras de entulho e cadáveres a arder, avessos obscenos, plasmas orgânicos e minerais, o humano e o que lhe pertence, naturalmente fundidos.
Os mortos ainda tinham os braços levantados, os olhos abertos. Imobilizados no preciso momento em que o ímpeto vital lhes foi mais intenso. O momento decisivo.
A cidade estava aos pedaços e as pessoas vagueavam em terror sobre os escombros, mas não em qualquer zona. Algumas permaneciam inexplicavelmente vazias. Tornaram-se de súbito inóspitas, mesmo para quem sempre lá viveu.
É curioso como ao se envolverem de morte, as pedras se tornaram vivas como monstros. Era preciso coragem para as olhar de frente, e muitos não a tinham. As ilusões de óptica são traiçoeiras. O que parece um ferro torcido pode ser o braço de um irmão. O pedaço de um pneu rasgado pode ser a cabeça de um filho. Nunca se sabe o que se vai encontrar por baixo de uma placa de betão, no interior de um carro esmagado. Ou quem.
A certas zonas não se ia. Era melhor deixá-las no seu zumbido, o seu monólogo, os seus sinistros enredos telúricos. Um ser humano não tinha nada a fazer ali.
Subi ao ponto mais alto da cidade, de onde se via tudo. No orfanato Village Espoir um grupo de crianças fora colocado à parte. Eram uns 20 meninos e meninas em cadeiras de rodas, dispostos num terreno ao ar livre. Estavam ao sol, abrasador, e as moscas atacavam os que tinham mais dificuldades em se mover. Uns eram paraplégicos, outros vítimas de poliomielite, tinham os membros paralisados ou deformidades no corpo. Uns eram esqueléticos, outros faziam movimentos espasmódicos, mas nenhum me pareceu estar triste.
Olhavam a cidade destruída como se fosse um mundo que não era o seu. Como se o espectáculo da tragédia absoluta fosse para eles até motivo de algum divertimento. Talvez o alheamento ou a falta de discernimento se devessem às suas doenças, mas a verdade é que os meninos deficientes da Village Espoir sorriam. Os seus olhos negros e remelentos pareciam dizer: Já cá estávamos. Isto para nós não é nada.
A sua incapacidade e dependência não os levava a estarem aflitos. Tal como na noite cerrada um cego é o único que vê, eles pareciam encontrar na catástrofe o seu elemento. Ao contrário do que aconteceu com as outras pessoas, na sua vida nada mudou, excepto a própria diferença.
Um artista que conheci em Port-au-Prince disse-me que, depois do terramoto, as pessoas passaram a olhar-se de forma diferente. Pela sua desmesura, o sismo foi sentido como um destino para todos, e a sobrevivência como um milagre.
Ter sido poupado equivalia a uma insuportável cumplicidade com o monstro, e talvez por isso tantos testemunhos falem da felicidade, não de ter escapado, mas de ter renascido. É essa a forma como as pessoas se olham – como se nunca se tivessem olhado.
A sociedade haitiana é violenta, e não ficou melhor depois do terramoto, mas agora os homens fitam-se com um certo assombro. Um respeito que as circunstâncias impõem.
Cada ser humano é um prodígio. E é à luz desta lógica nova que não faz diferença nenhuma ser-se normal ou uma criança numa cadeira de rodas.
Agora, como nunca, naquele monte de onde se avista a cidade em escombros, os meninos deficientes do Haiti são anjos como todos os outros.

In PÚBLICO, por Paulo Moura.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Sensivel ao toque, mas iphode-se tocar à vontade

Ao que consta, anda por ai muito boa gente frustada/arreliada/irritada com a sensibilidade ao toque dos seus brinquedos, vulgo telemóveis-de-última-geração/iphad/iphone/iphode, etc.

Meia duzia de toques e já era/bloqueia/avaria/crasha

Que insensibilidade...

Nada como o material biológico. Phode-se tocar à vontade que nunca se avaria, não precisa de bateria e nunca se gasta. E com algum empenho a satisfação é garantida e não depende de terceiros (embora a conexão a dois seja muito mais satisfatória).

Vá-lá, srs. da Aplle (lê-se áple e não eiple), Microsoft e afins, beat this!

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Desculpa Deolinda, mas estás enganada

Geração parva? Geração rasca? Geração à rasca? Nunca uma geração teve tantas condições. Nunca uma geração teve tantas oportunidades de escolher/frequentar um curso universitário. Nunca uma geração teve tanto apoio económico ou social. Nunca uma geração teve tantos meios como a internet, bibliotecas, cursos, workshoops, informação, telemóveis, meios de transporte, casa dos papás, mesada para noitadas. Geração preguiçosa, isso sim! Nem para votar se levantam do sofa. Se não gostam de quem nos governa. Se não gostam da oposição, pelo menos votem em branco. Dizer que não resolve, é fácil. Reclamar no café com a barriga cheia, é fácil.

Fácil não é com certeza a vida da S. que tirou um curso superior que não lhe arranjou trabalho. E ela reclamou? Sim, mas fez-se à vida e está perto de acabar um segundo curso com mais perspectivas de emprego. E não teve papás para lhe pagarem os estudos. Teve que trabalhar a muito custo num centro de explicações.

Fácil não é a vida do F. que apesar de viver em casa dos pais, dá aulas e levanta-se ás 4 da manhã para frequentar o conservatório de Sevilha, para ter um futuro melhor. O curso de economia deu-lhe emprego? Não, mas deu-lhe a música, porque não foi parvo. Parva não é a Deolinda também, nem esta geração. Parvos são os papás que alimentam uma geração preguiçosa.

Nada no mundo é a preto e branco. Há uma infinidade de tons de cinzento. Num mundo ideal os empregados que não gostam ou não precisam de trabalhar, dariam o lugar aos desempregados que querem trabalhar.

Num mundo ideal, o Taguspark não pagaria, com dinheiro público, 350 mil euros ao Figo por 4 horas de publicidade.

Num mundo perfeito, os donos de pequeno comércio e mercearias não pagariam uma taxa de IRC superior à que pagam os bancos.

Num mundo ideal, o bastonário da ordem dos advogados não viria a público denunciar juizes e procuradores do ministério público de pré-combinarem sentenças, transformando os julgamentos em mediocres peças de teatro.

Num mundo perfeito toda a gente teria emprego. Mas o mundo não é perfeito. E só nos resta fazer parte do problema, ou da solução. A escolha é nossa.

Geração parva? Sim, se forem na cantiga e não mexerem o rabinho.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

É a super-mulher?É um furacão?Não, é a mulher em movimento!

Houve uma altura na minha juventude em que fiquei sériamente preocupado com o futuro da mulher e do homem. Na altura acordava e a primeira coisa que os meus olhos focavam era, não os seios, mas o decote da Linda Carter, e depois os calções super justos do seu fato de Super-Mulher. Era-me inconcebivel, imaginar um mundo onde homens e mulheres vestissem igual e fizessem as mesmas coisas, como apregoavam as feministas na altura, com cartazes e slogans de igualdade para ambos os sexos. Mas que piada tinha agora uma mulher andar vestida de fato e gravata (algo que agora considero bastante sexy) e um homem de saia a fazer de babysitter?!

Entretanto cresci e fiz-me homem. E homem que é homem cospe no chão, bate na mulher e diz palavrões.Não, não. Não desses. Embora de vez em quando não consigo evitar chamar nomes ao árbitro e largar um palavrão quando vejo a conta do dentista. Fiz-me homem com cada vez mais apreço e admiração pela mulher moderna e detentora de todos os mesmos direitos e deveres que nós homens sempre tivemos. Agora elas já não se calam, não se subtraem e tem voto na matéria. E respirei de alívio ao constatar que as saias para homens não sairam da Escócia e as mulheres continuam a exibir aquilo que as torna tão femininas. Quisesse Deus (ou o que quer que seja que nos tenha criado) que fôssemos todos iguais, além das raças e cores não nos teria diferenciado entre homens e mulheres. Pertencíamos todos ao mesmo género e o assunto estava arrumado.

Felizmente Deus teve bom senso e vivam as diferenças (mas que monotonia isto seria se assim não fosse). E esta nova mulher, emancipada e independente pos-se a mexer. Além do emprego e das reuniões de trabalho, dos filhos, da casa, ela tem sempre imensas coisas para fazer e quando não tem, inventa. Ela vai à ginástica, vai ao cabeleireiro, tira cursos de teatro de pintura, viaja sozinha, vai a exposições, cinema, clubes de leitura. É uma mulher em movimento. É uma mulher interessante. E se o homem é por natureza predador, e a mulher uma presa, então uma presa em movimento, que de muito mais luta, é uma presa muito mais interessante. E isto tem muito que se lhe diga, pois quando damos conta, a presa já saltou do sofá e anda sabe-se lá por onde, obrigando o caçador a voltar a caça-la e isto tem mais piada do que ter uma presa sossegadinha em casa, deitada no sofa a bocejar. E já dizia Bukowski: não podemos estar sempre nem a comer, nem a dormir nem a foder, por mais que queiramos, e por isso é que inventaram a filosofia.

Estas mulheres em movimento assustam muitos homens. A ideia da mulher ter a sua propria vida é algo que muitos homens não aceitam e outros perferem ter menos trabalho, optam por uma sossegadinha que dê menos trabalho. Mas isso é lá com eles, a mim não me assustam nada, pelo contrário, fascinam-me. Se uma mulher em movimento ainda consegue arranjar tempo para mim, é porque se importa verdadeiramente. E quando não tem, que seja quando o Benfica joga.

Mulheres sossegadinhas, pela vossa saúde, mexam-se!!!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Nina: Vim pedir-lhe o papel.
Leroy: A verdade é que, quando eu olho para ti, só vejo o Cisne Branco. Sim, és muito bonita, tímida, frágil - o casting perfeito. Mas então e o Cisne Negro? É um trabalho fodido fazer os dois.
Nina: Eu também consigo fazer o Cisne Negro.
Leroy: Ah, sim? Em quatro anos, sempre que danças, vejo-te obcecada em fazer cada movimento na perfeição, mas nunca te vi deixares-te ir. Nunca! Toda essa disciplina para quê?
Nina: Só quero ser perfeita (murmura)
Leroy: O quê?
Nina Eu quero ser perfeita.
Leroy: A perfeição não tem só a ver com controlo. Também tem a ver com soltar-se. Surpreender o público. Transcendência! Muito poucos a têm.
Nina: Eu acho que a tenho.

Argumento: M. Heyman, A. Heinz, J. McLaughlin

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Cisne Negro

Eu sabia que este blog ia dar nisto...

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

O cabo dos trabalhos...


Gaivotas em terra, mau tempo no mar. Politicos no ar, em terra não ficar. Isto só para rirmar, que ao mar lá me fiz eu, e a carta de marinheiro tirar. E é quando descubro que muitas das nossas expressões populares tem a sua origem nos dizeres dos nossos antepassados marinheiros, pois quando ouvimos alguém dizer: "Poem-te na alheta!" não é mais que ir para a parte de trás do barco (assim apelidada: alheta). "Ganda cachola!" não é mais que a vara que liga ao leme e nos permite manobrar a embarcação. O Bombordo é uma expressão 100% portuguesa, usada em todo o mundo e refere-se ao lado esquerdo da embarcação. É que no tempo dos descobrimentos, o lado esquerdo significava... Africa! Dai o bom bordo (as caravelas ao sairem dos portos portugueses, tinham Africa do lado esquerdo). Também se aprende que as únicas "cordas" a bordo, são a corda do relógio e a corda do sino... as outras são CABOS! E o seu cojunto designado por "Massame". Ora no massame temos os cabos de massa, os de arame os solteiros e os fixos. Os solteiros são aqueles (e agora passo a citar) que estão livres e por isso prontos a trabalhar em qualquer local.... Os fixos são aqueles que fazem parte do aparelho fixo do navio e como tal, não servem para mais nada! E agora imagine-se! Os cabos solteiros, são os que estão metidos em ..."sarilhos"!! Que é o objecto onde se enrolam os cabos solteiros. E já a minha mãe me dizia em tenra idade:"Luisinho, Luisinho, não te metas em sarilhos!!!"

E depois há as marés, mar e mar, ir e voltar. Vamos lá ver se não me afundo, que em terra já só se governam as gaivotas e.... os abutres.

e não se metam em sarilhos, que é o cabo dos trabalhos...

sábado, 2 de outubro de 2010

Digam lá a verdade, mas afinal, o que é que querem?

e nestes dias quentes de verão, em que estive ausente, a viver a vidinha, recebi vários e-mails a questionarem-me se voltaria aqui a escrever. Eu próprio me questionei: «Mas escrever sobre o quê? A crise? O orçamento? O buraco da despesa pública? As alterações climáticas? A praga de mosquitos? O mau inicio de campeonato do Benfica?»
Mas afinal, o que é que é realmente importante? Sobre o que é que vale a pena escrever? O que é que é verdadeiramente importante e nos toca a todos? Sim, lá no fundo(não, não, não é a crise, esta não toca a toda a gente). E a resposta é tão básica e tão obvia: a felicidade. Todos desejamos ser felizes. Mas... o que é a felicidade? Qual a formula definitiva? Sim, porque para alguns, a felicidade é um golo do benfica, para outros são os números do euromilhões, ou ser promovido, ou comer um bom cozido. E depois encontramos pessoas felizes com tão pouco e em situações que para nós nos levariam à infelicidade, que só prova como a felicidade é tão subjectiva...
Entretanto vejo o ínicio de um filme: "Barreira Invisil", de Terrence Malick, e lembro-me de um estudo que põe no pódio da felicidade: Vanatu, um arquipélago da Melánesia!?, onde as pessoas tem um um grau elevado de satisfação com a vida. Ao contrário da industrial Alemanha, com uma elevada esperança de vida, com Iphones, BMW's e Mercedes. Mesmo assim, à frente dos organizadíssimos e limpinhos paises escandinavos: 112º Dinamarca, 115º Noruega e 123º para a Finlândia. E entre um mergulho no mar, ao sol de uma praia algarvia, penso no dinheiro, no consumo, numa elevada esperança de vida. Na escala de valores. Nos paises e pessoas ricas, que talvez se enganem em dar tanta importância ao dinheiro. De facto, no nosso sistema de valores, o dinheiro e o status ocupam os primeiros lugares. Ao contrário da avaliação que nos dão os "economistas da felicidade", que nos dizem que nada causa mais felicidade que as relações entre as pessoas, isto é, a vida em familia, os jantares de amigos, o convívio, o café com, os companheiros/namorada/o. A seguir vem o sentimento de ser útil (mesmo desempregados, podemos sempre fazer voluntariado), depois, segundo as circunstâncias, a saúde e liberdade.
Quem procura a felicidade na procura incessante de bem-estar material e de estatuto social para impressionar os outros revela um comportamento de carência. Aliás, o capitalismo leva consigo a lógica da insatisfação: quanto mais se tem, mais é preciso ter.
E nesta lógica, neste ambiente pesado de crise económica, acredito que o slogan deveria ser: Felicidade para todos e não o crescimento a toda a força da economia e do PIB, e o que isso implica: corte nas despesas e aumento do desemprego. Para mim, um leigo em economia, o pleno emprego é mais importante que o crescimento do PIB.
Um estudo recente revela que metade da população portuguesa tem dificuldades em sobreviver economicamente, no entanto, 70% dizem que são felizes e não é por acaso, pois ainda somos um povo que valoriza a familia e os amigos.
E quantos euros vale um beijo? Um abraço? Um mergulho no mar? Uma jantarada de conquilha acabadinha de apanhar com os amigos? Um passeio a uma terra desconhecida? Uma gargalhada? Um carinho de um cão ou gato? Observar o pôr do sol? Um obrigado?
Afinal a crise é de quê?

domingo, 12 de setembro de 2010

Gigante azul



é um baque enorme no coração. Um nó no estômago. Um aperto forte seguido de uma explosão de adrenalina. Um misto de Medo/Ansiedade/Euforia. As pernas correm. Correm para a frente mas com uma certa reserva. O coração bate mil à hora alimentado pelo medo/adrenalina que me estala nas veias. Entro na água calculando a corrente e a distância a que me encontro da mulher. Apenas vejo uma mancha escura no meio da espuma branca das ondas. Mergulho por baixo da espuma da primeira onda. Uma duas tres vezes, sempre tentando não perder a mulher de vista. Avisto um braço no ar. Os olhos ardem do salitro. As ondas repetem-se. Batem forte. Não dão tréguas. O som é ensurcedor. Têm vida própria. Entro na corrente forte. Nado rapido. Alcanço a mulher, mas não me aproximo. Vejo o medo nos seus olhos. Vermelhos de pânico. Grita por favor que a tire rapido dali. Entrego-lhe a boia e tento acalmar-nos com um sorriso e que está tudo bem, mas uma onda que nos engole por alguns segundos, desmente-me. Venho ao de cima e engulo o maximo de ar possível. Nado em direcção à costa. As ondas engolem-nos. A corrente é fortissíma e puxa-nos para trás. Bato os braços e as pernas com todas as forças. Grito à mulher para me ajudar e bater as pernas ao passar a onda. Sinto o esticam da boia de salvação estrangular-me o peito assim que a onda passa. Dou duas braçadas. Outra onda. Outro esticão. A onda cobre-me. A corrente puxa-me. A cinta estrangula. Respiro. Bato as pernas. Os braços. Os musculos doem. Abro a boca, tento respirar no meio da espuma. Vem de todos os lados. É um turbilhão. Levanto a cabeça. Vejo uma multidão na praia. Bato os braços as pernas. Sinto-me impotente. Engulo água. Abro a boca. Tento respirar. A onda submerge-me. Tento respirar. Parece que estou ali há uma eternidade. Já não sei com quem luto. Com o mar? Com a corrente? Com o medo? Oiço vozes. Vejo rostos. O meu pai. A minha mãe. Penso na morte. É estúpido demais. O medo. Bato os pés. Bato as mãos. Contra o medo. Contra o mar. O peito arde. Os olhos ardem. Os muscúlos doem. Não, tens que nadar. Tens que nadar. Sinto o esticam da cinta. A mulher ainda está agarrada à boia. O mar ruge como um demónio. As ondas vem de todo o lado. A espuma arde-me os olhos. é uma massa de água esmagadora. Um turbilhão violento. Sinto que não consigo sair dali. O ar é escasso. Já não penso em nada. Nado. Bato os pés. Bato as mãos. Bato os pés. Bato as mãos. Já não oiço o mar. Já não sinto os músculos. A dor desapareceu. O turbilhão ensurcedor desvanece-se em silêncio. E uma voz na cabeça. Não. Não é na cabeça. É o Duarte. Passa-me a cinta ligada ao carretel (uma corda de salvamento presa em terra a uma estrutura metálica). Sinto um puxão. Fecho os olhos. Agarro-me com toda a força. Sinto a cinta que me prende à mulher a estrangular-me o peito. Somos arrastados em direcção à costa. Deixo de nadar. deixo-me ir.Arde. As ondas empurram-nos. Oiço vozes. Vejo as pessoas na praia a aumentarem. Aproximamo-nos da costa. Os pés começam a tocar na areia. Temos pé. Algumas pessoas amparam a mulher e levam-na para terra. Largo a cinta e saio da água. Os bombeiros levam a mulher para o posto medico. Aparentemente está bem. Sento-me na areia para recuperar o folego. As pernas bambas e sorrio para o mar ainda com o coração a bombar adrenalina «ainda não foi desta». Estranha esta minha relação com o gigante azul. De amor, paz e tranquilidade, intensidade desassossego e extâse. O mar é sem dúvida feminino.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Nova estrevista com o Cusco!!!A não perder!


Bem, esta entrevista é difícil, tal a possibilidade de voltar a poder fazer perguntas (veja as outras entrevistas aqui e aqui)a uma tal sumidade... Cusco, o que podemos fazer para ter um mundo melhor?
-Paz e amor.
Mas como, se há cada vez mais casais infelizes e divorcios?
-Pois, isso é um grave problema. Quando as pessoas deixam de gostar uma da outra, ou quando um deixou de gostar, não há nada a fazer.
Mas como é que um casal, depois de juras de amor eterno, chega a esse ponto?
-A maior parte das vezes, eles são incompetentes como maridos e elas às vezes são muito melgas.
Incompetentes??
-Ora, o homem chega a casa e instala-se no sofá a ver a sport Tv e depois não faz nada e pior, não fala nada ou quanto muito fala enquanto lê a Bola. Falham no companheirismo, na ternura, na amizade. E elas gravam tudo.Têm mais memoria que um disco rigido. E à mínima discusão, atiram-lhe tudo à cara. Mesmo coisas que ele fez há 20 anos atrás, como quando se esqueceu de desligar o fogão, a pedido dela que se estava a arranjar para ele, mas ele não tirou os olhos do Benfica-Sporting e lá se foi o soflê que ela preparou com tanto esmero.
As pessoas mudam?
-As coisas podem mudar. Cultivar é fazer coisas importantes no dia-a-dia. As relações tem fazes de grande seca.
E mesmo assim as pessoas insistem em casar..
-è inato. Faz parte do projecto de vida de muitas pessoas. A felicidade pessoal passa muito por aquilo que se chama o amor ou a relação amorosa.
Existe uma certa tendência para se partilhar tudo. Isso é prejudicial?
-Costumo dizer que só se conhece verdadeiramente uma pessoa em duas situações: o divorcio e quando partilha a casa de banho. O cúmulo da intimidade é partilhar os puns. É verdade!
Não é partilha a mais?
-Os puns à noite são involuntários. Mas devemos partilhar o que quisermos. Há casais para quem a conjugalidade é partilhar tudo, da casa de banho ao dinheiro. A intimidade não é forçosamente as pessoas saberem tudo uma da outra. Não é como acontece com os casais ciumentos, em que andam a vasculhar os emails e os sms do outro.
Há alguma coisa que os casais devam evitar a todo o custo?
-A crítica. O hipercriticismo mútuo ou só de um lado: "tu és isto, tu és aquilo, tu és sempre a mesma coisa, tu fizeste isto,fizeste aquilo.." Há pessoas que tentam que o outro seja igual a elas próprias, que não aceitam a individualidade do outro. Ninguém muda ninguém.
Acha que os homens são mais responsáveis pela falha na relação?
-É mais falta de jeito. Há que dizer-lhes:"Oiça lá, você assim não vai lá. Ainda gosta dessa mulher?Então vá lá e mostre-lhe que gosta dela."
Os homens continuam a ter mais dificuldade em mostrar os sentimentos?
-É uma questão cultural. Tem medo de se expor de serem considerados fracos. Mas a responsabilidade não é só deles. Elas por vezes também são muito chatas, dá vontade de dizer:"Oça lá, não ande a perseguir o homem, não o melgue tanto que ele não aguenta."
Porque é que as mulheres são mais melgas?
-Não sei. Sempre foi assim. Têm mais necessidade de expressão, de um sorriso, de um telefonema, de um convite inesperado. Eles são mais "tumbas" para estas coisas.
Ainda há muito isso de dar a coisa por garantida?
-Sim. Dos dois lados. Mas talvez um pouco mais do lado deles. Eles também engordam, mas não são penalizados porque são homens. Mas as mulheres também reparam nisso e já há quem lhes diga:"Ouve lá, eu, com esse teu corpo de hipopótamo, não tenho atracção por ti..." e isto arrasa um homem.
Mas não são eles que dão mais importancia ao corpo?
-São. A atracção sexual nos homens passa muito pelo corpo. A atracção feminina é uma coisa mais complexa. Como a pesspoa é, como se exprime, como pensa, nos interesses comuns. Já a atracção masculina é muito mais fisica, o que depois pode ser muito complicado. O corpo ao longo do tempo vai mudando. Por isso é que eles ás vezes as trocam por uma mais nova. Vê-se muito pouco o contrário, embora já aconteça.
E será só por causa dos corpos?
-Provavelmente também porque as mulheres não tem muita paciência para um homem imaturo e acriançado. Também me pergunto o mesmo, o que é que eu fazia com uma miuda mais nova, para além de ir para a cama, depois como é que é? O que é que fazia?
Na maior parte das vezes, os homens quando se divorciam, acasalam outra vez.
-Alguns é logo no próprio dia.
Porque?
-Por muitas razões. Não sabem estar sozinhos, são tontos, foram mal educados, tem dificuldades em ficar sozinhos, com o dia-adia da rotina de uma casa.
As mulheres resistem mais tempo sozinhas?
-São mais autónomas, e por outro lado tem os filhos.
Não porque o desejem?
-Não, é porque aguentam. Depois também arranjam novas relações, mas como tem os filhos tem menos disponibilidade e hesitam mais em introduzir uma figura nova na familia. Os homens são mais impulsivos e depois tem facilidade na caça, em caçar.
Pensei que as mulher também caçavam...
-As mulheres deixam-se caçar. Um homem só caça quando a mulher quer. As mulheres tem mais dificuldade em caçar por caçar, ainda que pós divórcio aconteçam fazes dessas. Os homens tem mais facilidade me caçar,e é muito frequente depois de uma separação haver nos homens uma espécie de regresso à adolescência.
E depois recomeçam tudo outra vez?
-Há segundos casamentos com grande sucesso porque os primeiros foram grandes erros de casting, outros que duram apenas um ano ou dois. Não há nenhum casamento verdadeiramente feliz que viva só de mesa e cama.
Mas afinal para os homens não está tudo bem se houver sexo?
-Hoje em dia cada vez menos. Haverá alguns que aceitam isso, mas nunca será uma relação completa e satisfatória.
O que não se deve fazer para manter um casamento saudável?
-Não se deve criticar o outro levianamente, nem a sua familia:"a tua mãe isto, a tua mãe aquilo..." é tempo perdido. A amizade que existe num casamento é diferente, mas a pessoa deve sentir que o outro a apoia mesmo que eventualmente não esteja de acordo com ela.
E onde fica a franqueza?
-Até se pode dizer, mas não na altura, a quente. Costumo dizer que quando querem dizer as coisas desagradáveis, digam quando estiverem bem um com o outro.
Hoje as pessoas não se ouvem muito, pois não?
-Têm pouca paciência. Às vezes é uma seca, é melhor estar na internet ou a ver o telejornal.
E para combater isso, qual o melhor conselho aos casais para serem felizes?
-Riam. Riam-se muito. É fundamental.
Mas Cusco...é de dia e os ouriços-cacheiros vivem à noite e dormem de dia... o que é que está aqui a fazer a estas horas? Não devia estar com... Cusco! Cusco!!! Olha...desapareceu...

domingo, 25 de abril de 2010

Ando cansado de ti e do teu humor de merda com tantas tardes de chuva. Nem sequer tinha pensado em te escrever. Ia escrever sobre a revolução, o vermelho dos cravos, ou sobre o graffite na rua das arcadas. Mas depois pôs se sol e comprei um corneto de morango e, juro-te, há sempre miúdos a jogar à bola na rua das laranjeiras. Hoje, finalmente a bola fugiu para os meus pés e dei dois toques antes de passar ao miudo gordo e sardento, com a t-shirt do FCP. O dia corria-me bem, até porque estava maré-baixa e cheirava a maresia. E na esquina da praça já não se vendiam castanhas, mas flores a tentarem sobrepor-se ao vermelho dos cravos. Até vi um casal de namorados nos resguardos da ponte, que namoravam como nos filmes. E a senhora das esmolas, que por momentos se esqueceu de estender a mão e viu-se no reflexo das águas do rio. E perguntei-me se seriam doces ou salgadas, as águas do rio. Queria falar da liberdade, mas distrai-me com as estrangeiras giras com ombros de alças marcadas pelo sol. E o reflexo das velhas fachadas constantemente lavadas pelas águas do Gilão. E esqueci-me porque me fodes o juizo. Estou a escrever-te a ti. sabes, ás vezes estás-me tão entranhada

segunda-feira, 19 de abril de 2010

A admirável natureza humana

Um grande capitalista decide visitar a quinta do sogro recém entrado na familia. Numa atitude de sobranceria e prepotência propôe-lhe:
- compadre, tanto estrume... não lhe faz confusão?
- não, é natural numa quinta com animais.
- e se eu lhe der ...500 euros! Você é capaz de comer uma bosta de vaca?
- 500 euros...

e o compadre agricultor, a pensar nas vacas que podia comprar com 500 euros, engole a bosta.
O sogro capitalista, surpreendido com a facilidade com que o compadre engoliu o poio de vaca, e como nunca tinha perdido tanto dinheiro em tão pouco tempo, tenta recuperá-lo:

- Ó compadre, e se eu comer também uma bosta de vaca, você devolve-me os meus 500 euros?
O agricultor não pensa duas vezes, pois ver o sogro arrogante de gravatinha a comer uma bosta de vaca, é algo muito raro de se ver numa vida inteira e aceita.
O capitalista engole a bosta a muito custo e lá recupera o seu dinheiro.

passado meia hora o agricultor pergunta:
- Ó compadre.... mas porque é que comemos aquela merda toda?...

quarta-feira, 14 de abril de 2010

terça-feira, 6 de abril de 2010

A vida é demasiado curta para perdermos tempo a entediarmo-nos

"A felicidade tem mau marketing porque exige coragem. Para começar, a coragem de aguentar os dichotes desdenhosos dos que desistem dela. Um rapaz que aos 65 anos vai no quarto casamento, dizia-me há dias que está farto de ser olhado com paternalismo por homens acomodados na rotina das pantufas conjugais e dos engates ocasionais. Diz este meu amigo que não entende como conseguem as pessoas dormir com alguém que já não desejam e desejar alguém com quem não podem dormir. Talvez não sejam capazes de desejar sem interdições, o que significa que o objecto real do seu desejo é o proibido. É difícil estimarmos aquilo que temos. Lembro-me sempre da história daquele homem que, sendo encantador com a noiva durante os seis anos em que noivaram, se tornou frio e bruto ainda na lua-de-mel. Quando a mulher lhe perguntou a causa daquela mudança, retorquiu: "Ninguém corre atrás de um comboio quando já vai lá dentro." Uma história de outros tempos, como pensa a própria protagonista, hoje já transformada em comboio vazio por morte do ingrato passageiro? Nem por isso. Raros cavalheiros se atrevem hoje a expressar o que lhes vai na alma com a eloquência deste falecido apreciador de comboios em fuga - tornaram-se mais cuidadosos no falar, desde que os comboios se transformaram em TGVs supersónicos. Uma palavra a mais pode provocar uma sacudidela a alta velocidade, capaz até de os catapultar para o desabrigo da linha férrea, onde não se servem refeições quentes nem programas de televisão. Há dias, queixava-se-me um recém-divorciado, em voz de desespero: "Mulheres interessantes até há, mas todas tão incapazes de estrelar um ovo como eu!" Citei-lhe as frases finais do fabuloso "Annie Hall", de Woody Allen: "- Doutor, estou preocupado, o meu irmão julga que é uma galinha. - Então traga-mo, para eu o tratar. - Eu trazia, mas preciso dos ovos." Uma citação propositadamente deslocada, porque me deprime menos pensar que todos nós precisamos de uma qualquer espécie de ovos ainda por inventar (a Clarice Lispector percebia muito disso) do que pensar que os seres com quem contraceno andam mesmo e só à procura de ovos bem estrelados.

Na maioria dos casos, a iniciativa do divórcio parte das mulheres. Por causa dos ovos estrelados, ou dos ovos que cresceram e se tornaram filhos. Elas, em caso de necessidade, ainda sabem partir ovos - e entrar ou sair de comboios em andamento, mesmo com as mãos cheias de sacos de supermercado. E são elas quem fica com os filhos. Quando as mulheres começam a ameaçar separar-se, os homens clamam que não aguentam ficar longe dos filhos. As mulheres espantam-se, porque nunca deram pela força do amor paternal: era cala-te puto que o pai quer ver o telejornal, estás aqui estás a levar uma lamparina - e, de repente, a criança ignorada torna-se o centro do mundo. Este discurso tem o condão de comover as outras mulheres que querem ficar perto destes pais extremosos, e de quem eles não querem mais do que umas cópulas revigorantes. Com tanto sentimento, não sei como sobrevive a prostituição. Deve estar reduzida àqueles de quem nunca ninguém quis ter um filho. Pobres trabalhadoras.

Um homem que se case muitas vezes, e de sua livre iniciativa (isto é, sem ter sido empurrado do comboio por uma mulher farta de o aturar) é visto como um ingénuo: escolhe a chatice da mudança e da despesa constante, em vez do regalo do lar e o consolo dos casos por fora. Para quê mudar, se nada é eterno e tudo se torna hábito? Precisamente por isso, diz o tal meu amigo que insiste em casar-se: "A vida é demasiado curta para perdermos tempo a entediarmo-nos. Eu gosto de partilhar tudo. Acho que se aprende mais a dois do que sozinho, do mesmo modo como se aprende mais tendo amigos do que não tendo. É uma tristeza viver com uma pessoa com a qual já não se partilha tudo." Vidas cinzentas. Hipócritas, mas isso é o menos - o pior é a tristeza, porque chega um dia em que já não há crianças barulhentas em casa nem sobra charme para engatar a vizinha. E morre-se sem ter mudado nada. Morre-se sem ter experimentado o trabalho infinito da felicidade. Este meu amigo não vai morrer assim. Será lembrado com alegria pelos três filhos e pelas várias mulheres que soube amar. O amor não se perde, apenas muda de natureza. Desde que saibamos escutá-lo e acarinhá-lo. Há é pouca gente para dar por isso."

Texto publicado na edição da Única de 20 de Março de 2010, por Inês Pedrosa.

sábado, 27 de março de 2010

I wanna do bad things with you




Sabem qual é a diferença entre uma enoteca e uma eroteca?

A primeira distorce os sentidos, a segunda, apura-os...


E porque o dia da mulher é quando (um homem quiser) a mulher quiser, e quando a mulher quer, pode ser muito erótica, e quando a mulher é muito erótica, pode muita coisa, mas se a rotina e o trabalho lhe esgotam a libido e a imaginação, a Sexto Sentido resolve. A primeira eroteca a abrir em Portugal, e o principal objectivo é explorar o prazer de uma forma íntima e sem barreiras. Não, não é uma sex-shop. Aqui respira-se erotismo, sem descurar a sexualidade. Explora-se o prazer e sensualidade, de uma forma íntima e sem tabus.


E o que é isso de erotismo, perguntam as mais distraidas. Eu como homem diria que é ser surpreendido com um ambiente de média luz, tipo velas e castiçais à moda vampiresca. Um striptease ao som desta música, mas só até à lingerie. Apartir dai o strip passa a dois e de strip passa a dança mas... de olhos vendados, e as brincadeiras têm o limite que a imaginação quiser: banhos de champanhe, massagem indiana, chupa-chupa de chocolate, cubos de gelo, hortelã-pimenta, chá quente, vibrações, palavras sugestivas sussurradas ao ouvido, e isso tudo que estão a pensar e nem a vocês próprias confessam.


Pena esta eroteca ser só na capital, mas para quem está longe, e porque não um fim-de-semana (sexto)sentido?





as saudades que eu tenho deste genérico...

quinta-feira, 25 de março de 2010

e volto a ficar capturado

e quando fico capturado naquele momento meu, imagino a quantidade de coisas que existem entre mim e o meu futuro. Acho que não sei viver. Que não sei viver como os outros vivem. Sou um saloio. Não há dias iguais, e as cores não se repetem. Apetece-me sentir. Fascina-me. Como a primeira vez que os meus olhos tocaram o corpo nu de uma mulher. E neste preciso momento, no tempo que dura uma respiração, só me apetece olhar para ontem e imagino a quantidade de coisas que existem entre mim e o meu futuro

quarta-feira, 24 de março de 2010

Efeito Tim Burton

A príncipio pensei que fosse algum efeito especial. E depois esta moda dos filmes a três dimensões. Mas não, era mesmo um cão que estava ali, duas filas abaixo da minha. O cão seguiu o filme muito atentamente e com muito interesse. Ora comentava com o dono alguma passagem mais significativa do filme, ora ria a bom rir. E comovia-se nas passagens mais comoventes. E juro que até o vi bater palmas com as duas patas dianteiras.

Há saida do cinema não me contive e dirigi-me ao dono do cão:
- Olhe que o seu cão é formidável! A maneira como ele seguiu o filme, e como o apreciou!
- Pois - diz o dono do cão. - Isso espanta-me tanto mais quando ele não gostou nada do livro.

Só para que conste, o cão era um Fox Terrier.

terça-feira, 23 de março de 2010

Tudo é economia, já dizia Marx...até o amor.

Tenho a estúpida sensação que as pessoas vêem os sentimentos como uma doença e algo a esconder a todo o custo. A enterrá-los num buraco para se esquecerem que os tiveram.
E tenho a estúpida sensação que as pessoas já sabem tudo de tudo. Sabem tudo sobre sentimentos, sobre sexo, sobre drogas, sobre politica, sobre o Socrates, sobre a vida dos outros...
- Não sabes nada da vida... o teu mal é leres demasiados livros românticos.. - dizia-lhe ela.

e anda tudo numa correria louca.. numa ânsia...
numa ânsia de chegar primeiro
de sucesso, reconhecimento, dinheiro

- Amor? Sentimento? Paixão? Andas a ver filmes a mais... -dizia-lhe ela.
O sonho fora trocado pelo sonho de ser famoso, de aparecer, de ser conhecido em todo o lado. Adorada e aplaudida, e o resto é conversa. Ali não há lugar a sentimentos frustados nem o sofrimento de uma decepção amorosa. Isso é só para os tolos.

- Sabes porque te amo? -dizia ele.
- Porque sou bela?
- Não, porque tenho a impressão que consigo ler o teu coração...
- Ler!Ler!Ler! Passas a vida a ler! E se fizesses alguma coisa útil para variar? Agora não tenho tempo, tenho que ir, já estou atrasada. - e ele ficou a pensar de que é que ela tinha medo? Do sentimento? Do compromisso? Da decepção? Do sofrimento? Que mais valia a solidão de uma vitória, ao calor de um abraço? ou as palmas do público ao beijo apaixonado?
Uma vez olhei no rosto do amor e encontrei o espelho dos meus sonhos.
Com quem é que ela aprendeu a querer tão pouco?