Lembro-me que era inverno.Havia estalactites no gradeamento do muro da escola. Andava com a malta por ali, durante as manhãs e tardes, com as faces a queimar e as mãos roxas de frio. O coração a bater, as veias a latejar devido ao movimento, as fintas, os remates, o bailado de um jogo de futebol.Por vezes jogava sozinho até ao cair da noite. Lançava-me a correr. Desviava-me de jogadores imaginários. Desenhava lindas curvas e marcava grandes golos. Era um prazer de infância, cheio de uma força inesgotável e fabulosa!Enquanto isso, muitos dos meus camaradas usavam o tempo livre para andar atrás do inimigo! Para as namorarem! Rodeavam-nas. Flanqueavam-nas. Faziam-nas rir. Uma vergonha! Eu, orgulhoso, gozava sozinho o prazer de jogar à bola!Mas o inimigo já me tinha marcado! Rondava-me. Tinha os cabelos ruivos cor de fogo. Corpo franzino e delicado. Como as porcelanas da sala de jantar que ao mínimo toque partiam-se em mil bocados.Eram os apontamentos da aula anterior. Eram as dúvidas que mais ninguem tinha. Eram os toques acidentais!Era...o inimigo!Mas eu era um duro e o jogo das nossas vidas aproximava-se. Não podia perder tempo, nem a concentração. Aquele jogo era tudo! Tudo! Não havia mais nada! Era vida ou morte!Rispidamente disse-lhe que não. Era só uma dúvida simples. Uma equação de matemática. Não! Não tinha tempo!Chegou o grande dia!A emoção! As pernas bambas! A batida do coração! As veias a latejar! O rubor na face! Mas haveria algo melhor que isto? Impossível!Entrámos em campo. Suou o apito! Corremos! Lutámos! Sangrámos! Demos tudo por tudo até à ultima gota de suor. E por fim saboreamos o sabor amargo da derrota! A humilhação! O reverso da gloria. Nem o facto da equipe adversária ser um escalão acima do nosso, nos serviu de consolo. Nada servia de consolo! Nada!E mais uma vez eu estava enganado!Sai do campo cabisbaixo. E lembrei-me da equação. E senti uma mão agarrar na minha. Dedos delicados. Quentes. Levou-me para um banco, debaixo de uma árvore. E pela primeira vez na minha curta vida, o sonho escondido realizou-se e pus a minha boca na boca vermelha de uma rapariga. E senti-lhe o calor, a humidade, o gosto, a suavidade, o devaneio, o embaraço, o prazer e preplexidade que quase me roubou a respiração! E o melhor bater do coração de todos! Sim! Como eu estava enganado!E foi assim a minha primeira aventura de amor!
Ps: este post não é inédito, é um dos meus preferidos pelas recordações que me trás e um dos que mais gostei de escrever.
Carta ao Pai Natal 2024
Há 1 semana
2 comentários:
o primeiro beijo é smp uma aventura.
alias, o amor é uma aventura
Parece mesmo que adivinhaste qual ia ser o tema do meu próximo post...:)
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